O essencial do voluntariado: histórias, vivências e lições que transformam
Por Carolina Toffoli, Gerente do Instituto Algar
Eu tive uma a vivência transformadora no Campo de Refugiados de Dzaleka, no Malawi, um dos 5 países mais pobres do mundo, que fica no continente africano. Durante duas semanas, mergulhei em um universo de desafios inimagináveis, mas também de força, esperança e humanidade. Foi uma experiência que não apenas ampliou minha visão sobre o mundo, mas reafirmou o poder do voluntariado como uma troca que transforma tanto quem ajuda quanto quem é ajudado.
Dzaleka: histórias de dor e superação
Dzaleka nasceu para abrigar 10 mil refugiados, mas hoje acolhe mais de 56 mil pessoas – homens, mulheres e crianças que deixaram tudo para trás em busca de paz e dignidade. Essas pessoas enfrentam dificuldades extremas: falta de moradia adequada, escassez de recursos básicos e, principalmente, a invisibilidade humana. Muitos vivem à margem de qualquer olhar externo, ansiando por serem vistos, ouvidos e respeitados.
O que traz alento e esperança para essa comunidade é o projeto Nação Ubuntu, da Fraternidade sem Fronteiras. Atualmente, o projeto emprega 873 trabalhadores locais, que recebem uma bolsa pelo trabalho realizado, chamada de motivação, e atende 934 crianças em uma escola construída ao lado do campo. Esse trabalho não apenas oferece sustento e educação, mas também reforça a dignidade e o sentido de pertencimento de quem já perdeu tanto.
Construindo mais que casas: reconstruindo sonhos
Nosso grupo de voluntários se mobilizou para construir casas, um gesto de acolhimento que traz segurança para famílias que enfrentam condições extremamente precárias. Uma dessas famílias é a de Mayuma Rosafi, uma mulher de 42 anos que cuida sozinha de 10 filhos e 4 netos após uma tragédia familiar. A alegria de Mayuma ao receber sua nova casa foi contagiante, mas escolher quem seria beneficiado foi uma decisão complexa, já que cada história no campo é marcada por dor e resiliência e todas as famílias eram extremamente vulneráveis.
Nossa meta inicial era construir apenas uma casa, arrecadando R$ 17 mil. Mas, graças à mobilização nas redes sociais, ultrapassamos essa meta e conseguimos arrecadar mais de R$ 121 mil – recursos suficientes para construir onze casas. Essa conquista reforça a força da solidariedade e o quanto podemos ir além quando unimos esforços.
Lições aprendidas: o que o voluntariado nos ensina
Estar em Dzaleka foi um banho na alma, uma oportunidade de aprendizado profundo. Em cada sorriso, abraço e gesto de gratidão, percebi que o voluntariado nos ensina lições valiosas:
- A força da resiliência humana: Mesmo em condições extremas, as pessoas continuam a sonhar, resistir e buscar uma vida digna.
- A empatia não tem fronteiras: Ajudar na África ou no Brasil não precisa ser uma escolha excludente. Podemos fazer a diferença em qualquer lugar onde exista sofrimento e necessidade.
- O poder transformador do voluntariado: Quando ajudamos, também somos ajudados. A experiência é um verdadeiro banho na alma.
- Dar visibilidade ao invisível: Essas pessoas, muitas vezes esquecidas, querem ser vistas, ouvidas e reconhecidas. Precisamos iluminar suas histórias e dar espaço às suas vozes.
- A importância da fé e da gratidão: Mesmo diante da fome e da escassez, há gratidão e oração. Ver pessoas famintas agradecendo pelo alimento e esperando sua vez para comer é uma lição de humanidade.
- As crianças nos ensinam alegria e afeto: Brincam com o que têm, pedem colo, distribuem abraços e lembram que a felicidade pode resistir às maiores adversidades.
- A força das mulheres: Elas carregam a dureza da vida em seus rostos, mas seguem fortes e batalhadoras, sustentando suas famílias com coragem e resiliência.
- A busca por paz e liberdade: Esses valores, que muitas vezes tomamos como garantidos, são os maiores sonhos de quem vive em condições de privação e insegurança.
- A simplicidade ensina muito: Pessoas simples têm lições profundas a oferecer, desde que estejamos abertos a aprender.
- A alegria que floresce na adversidade: Mesmo em meio ao sofrimento, o sorriso, a esperança e o acolhimento persistem.
- A mobilização multiplica o impacto: Com união e solidariedade, é possível alcançar mais do que imaginamos. A meta inicial de uma casa se transformou em onze.
- O verdadeiro significado de dignidade: Essas pessoas poderiam reclamar de tudo ou pedir tudo, mas nos pedem trabalho, escola e moradia. Sua luta é por direitos fundamentais.
O impacto do voluntariado
O que mais me marcou foi perceber que, mesmo nos cenários mais desafiadores, a fé e a esperança florescem. Em Dzaleka, elas aparecem nas crianças que vão à escola com brilho nos olhos, nos trabalhadores locais que reconstruíram o sentido de suas vidas e nas orações que ecoam em meio às tendas improvisadas.
Minha gratidão vai à Fraternidade sem Fronteiras e ao projeto Nação Ubuntu, que nos se abriu para nossa parceria e nos deixou vivenciar a fraternidade. Eles transformam a realidade de tantas pessoas. Gratidão aos voluntários que acreditaram e se engajaram nesta causa. Tanto aos meus colegas que foram viver o voluntariado, quanto àqueles que fizeram suas doações e vibrações à distância. Que esta experiência inspire outros a estender a mão, a enxergar o outro e a acreditar que pequenas ações têm o poder de mudar o mundo.
O voluntariado nos ensina que, quando transformamos vidas, também somos transformados. É um caminho de aprendizado, troca e crescimento que ilumina tanto quem ajuda quanto quem é ajudado.